Na Justiça do Rio Grande do Norte, um pai conseguiu a minoração dos alimentos prestados à filha. Ele tem a guarda compartilhada da criança com a genitora, sua ex-esposa, que deverá arcar com metade das despesas fixas da menina. A decisão da 1ª Vara de Família da Comarca de Parnamirim deferiu o pedido de tutela antecipada, considerando a igualdade em padrão de vida e o tempo de convivência com a infante, além da redução da capacidade financeira do autor da ação devido à pandemia da Covid-19.
Atualmente, a criança passa metade do tempo na casa de cada genitor. Na ação revisional de alimentos, o autor buscou diminuir o valor da pensão alimentícia no valor correspondente a um salário mínimo e meio, acrescidos do pagamento integral de plano de saúde e das despesas escolares da filha. A mãe da menina, por sua vez, manifestou-se pela improcedência do pleito.
Em seguida, o autor apresentou manifestação a fim de que os alimentos fossem reduzidos para 50% dos valores correspondentes à mensalidade, material e uniforme escolar, bem como do plano de saúde, curso de língua estrangeira e atividade esportiva. Sustentou, para isso, o decréscimo de sua capacidade financeira após fechar sua empresa, principal fonte de renda, o que já o motivou a vender carro e imóvel residencial.
Necessidade e possibilidade
Em sua decisão, a juíza Suiane de Castro Fonseca Medeiros destacou a importância da manutenção dos alimentos em patamar que guarde proporcionalidade entre as necessidades da filha e as possibilidades do pai. Observou, ainda, que inexistem provas suficientes que apontem sobre a capacidade financeira da genitora, fazendo-se imprescindível tal apuração.
A magistrada também pontuou que, conforme tabela de divisão de dias, a filha partilha de forma igualitária do convívio com os genitores, “não se mostrando justo e razoável que o autor arque com a integralidade das despesas fixas da alimentanda, além do pensionamento em pecúnia”.
“Entendo ser justo e razoável que cada genitor arque com as despesas da alimentanda quando esta estiver em sua companhia, devendo as partes ratearem as despesas fixas advindas do pagamento de plano de saúde, mensalidade, material escolar, assim como curso de língua estrangeira e atividade esportiva, de forma igualitária, na proporção de 50% para cada um dos genitores”, concluiu.
Tempo de convivência e mesmo padrão de vida foram determinantes
Membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, a advogada Marília Varela atuou no caso representando o autor da ação. “A decisão tem especial relevo porque, além do tradicional binômio alimentar (necessidades e possibilidades), o juízo incluiu outro componente no cálculo dos alimentos: o tempo de convivência do pai com a filha e, por conseguinte, sua efetiva disponibilidade de dividir tarefas e responsabilidades na gestão de vida da criança.”
“Com efeito, a guarda compartilhada em si não tem o condão de modificar a obrigação alimentar. Todavia, em um cenário em que ambos os genitores tenham condições financeiras equivalentes e convivam igualitariamente com os filhos, não há razão para que um deles tenha uma prestação alimentar maior que o outro, independentemente do estabelecimento de um lar referencial”, defende Marília.
De acordo com a advogada, houve a demonstração de que os genitores tinham o mesmo padrão de vida e que conviviam a mesma quantidade de tempo com a filha. “Assim, a despeito do lar referencial materno, ao observar que cabia igualmente ao pai o pagamento da moradia, alimentação, transporte, vestuário e lazer da menina, além dos gastos inerentes à rotina de cuidados de uma criança, o juízo reconheceu não haver motivo para a permanência de prestação em pecúnia com a finalidade de custear o lar materno.”
“Além disso, a determinação do pagamento in natura de metade de todas as despesas fixas da criança também prestigia a guarda compartilhada, pois promove o diálogo dos pais em relação à gerência da vida dos filhos. Como não há um genitor específico responsável por custear integralmente uma obrigação, ambos os pais deverão conversar sobre uma possível troca de escola, a escolha de uma atividade extracurricular, entre outras decisões, evitando, portanto, um abuso da autoridade parental.”
Isonomia entre mãe e pai na guarda compartilhada
Para Marília Varela, a decisão “consagra o ideal da guarda compartilhada, pois divide igualmente os direitos e deveres dos genitores e porque promove o diálogo, peça-chave de exercício saudável da coparentalidade”. Além disso, o entendimento também caminha no sentido da isonomia entre homens e mulheres na criação de filhos.
“Há expressa confirmação de que tanto o homem quanto a mulher são provedores do sustento e do cuidado dos filhos. Ao reconhecer o envolvimento paterno nas funções diárias de criação dos filhos, a decisão retira do homem o papel exclusivo de provedor material e prestigia quem, de fato, também encabeça a criação da prole”, frisa a advogada.
Ela conclui: “O caso em análise nos permite constatar que a efetiva guarda compartilhada promove a ruptura da imposição dos papéis sociais exercidos por homens e mulheres. Por fim, o entendimento estimula a guarda compartilhada coativa, bem como fomenta a cultura do compartilhamento de tarefas e tempo entre os pais”.